12/05/2006

Vida alheia

Acho tão bom ouvir conversa dentro do ônibus. Aproveito e alimento minha natural curiosidade sobre a vida dos outros. Teve um tempo em que eu cheguei até a pensar em anotar e romancear os causos. E olha, tem cada história...

Meu ouvido já é treinado pra coisa e consigo ouvir até mais de uma história ao mesmo tempo. Imagino a vida da pessoa que tá contando, traço um perfil, invento o que ela faz, transformo a vida dela em um roteiro que se acaba quando desço do busão.

É minha diversão matinal.

Hoje de manhã sentei na cadeira atrás de uma moça meio perturbada – no meu roteiro é solteira, mora com a mãe, nunca se casou, coleciona bonecas Barbie, toma remédio pra dormir e tem mania de perseguição – poderia se chamar Helena, ou Leninha para os muito íntimos (porque ela não gosta de intimidade com qualquer um). Ela sentou ao lado de uma velhinha e danou-se a falar... falou do pai que é separado da mãe, do trabalho que ela ganha menos do que deveria, do café da manhã que tava quente e queimou a língua, do engarrafamento no aterro, das pessoas que fecham a janela do ônibus, do prédio do hospital que está em reforma, dos pombos que causam doenças, do frio que tá chegando...e a velhinha nem um piu. Caladíssima a viagem inteira – acho que era surda.

Fico pensando no que leva uma pessoa a falar de toda sua vida com um desconhecido dentro do ônibus e confesso, sinto pena dessa gente carente.

Mentira. Sinto pena nada. No fundo, eu adoro esses doidos que alimentam meus roteiros ligeiros que se acabam quando levanto e puxo a cordinha.

2 comentários:

Anónimo disse...

A já conhecida e globalizada ÔNIBUSTERAPIA. Terapia pra quem fala e pra quem escuta a vida alheia. A gente coleciona cada história...
Adorei o blogg, vou visitar - e me meter - sempre. Beijos...

Anónimo disse...

Eu acho, sabe Côrro, que você devia sim escrever esse livro. Agora, meu exemplar tem que ser de graça. Aliás, você como excelente jornalista que é (que falta que tu faz na equipe mulherrrrrr) seria uma excelente escritora. Aliás, vc já é né mesmo.